26 Janeiro 2024
Destaques
"Educar é preparar as gerações para o futuro e transformar. Depois, trazer para fora do individuo algo de novo que vai beneficiar a sociedade". As palavras são de Margarida Mano, Vice-reitora para a Qualidade, Inovação e Desenvolvimento, da Universidade Católica Portuguesa, proferidas na celebração da FNE/AFIET do Dia Internacional da Educação 2024, com a conferência “A Educação de que Precisamos – Refletir o PISA 2022 e as políticas de educação e formação para o futuro”.
O evento híbrido decorreu na tarde do dia 24 de janeiro de 2024, no Hotel Barcelona, em Lisboa, totalizando cerca de 150 participantes, 60 dos quais em modo presencial. Do programa constaram três intervenções de oradores convidados: Anabela Serrão, membro do Conselho Diretivo do IAVE (Instituto de Avaliação Educativa), Domingos Lopes (Presidente do Conselho Diretivo do IEFP) e Margarida Mano, acompanhados nas suas prestações por dois grupos de três comentadores, dos órgãos da FNE e da AFIET.
A abertura da sessão coube a João Dias da Silva, Presidente da AFIET, e a Maria José Rangel, Presidente do SDPGL. João Dias da Silva sublinhou o papel da Educação “como um direito humano, como um bem público e uma responsabilidade pública”, nas suas palavras “três vetores fundamentais e basilares para a perspetiva com que atuamos no setor”.
João Dias da Silva e Maria José Rangel
Para o Presidente da AFIET, “a melhor forma de garantir o direito à educação para todos tem de ser através de sistemas de ensino público gratuitos e de qualidade. Estamos todos unidos por uma Educação que preveja um futuro que os nossos alunos merecem, por salários dignos e por boas condições de vida e de trabalho pata todos os trabalhadores da educação”.
Por seu lado, Maria José Rangel saudou os participantes presenciais e online para um evento que partiria, na sua essência, dos resultados dos alunos portugueses no PISA 2022 da OCDE, publicados em dezembro de 2023, para culminar em propostas para o futuro melhor para a Educação em Portugal.
O efeito da retenção
Anabela Serrão, coordenadora nacional dos estudos internacionais que o IAVE implementa no nosso país, apresentou o tema "O desempenho dos alunos portugueses no PISA 2022 - resultados obtidos e consequências", focando, entre outros, aspetos específicos do relatório, relacionados com o processo de amostragem e com os diversos fatores de desempenho escolar dos alunos, como por exemplo as características do aluno, da família e da escola, sendo a retenção e o ano frequentado dos mais relevantes.
Anabela Serrão reconheceu que os resultados do PISA 2022 e de outras avaliações internacionais dos últimos anos entraram para Portugal numa tendência descendente, tendo o último ciclo do PISA sido muito marcado pela pandemia do COVID-19, que fez com que a generalidade dos países e economias participantes tivessem uma queda de cerca de 15 pontos na média da OCDE.
Por sua vez, Portugal obteve menos 21 pontos em literacia matemática, menos 15 pontos em literacia de leitura e menos 7 pontos em literacia científica. Este último declínio em ciências não foi estatisticamente significativo.
A oradora apresentou um pouco da história do Relatório PISA, seguindo depois para alguns números que mostraram que o PISA 2022 foi aquele que envolveu uma maior participação total de alunos (690 mil) e de países e economias (81). Em Portugal participaram 224 escolas e 6.793 alunos.
Anabela Serrão
A OCDE tem vindo a agregar ao teste PISA domínios inovadores, próximos daquilo que hoje é designado como conhecimentos e competências virados para o século 21, sendo que o ciclo de 2022 ainda contempla o pensamento criativo e uma avaliação opcional sobre a literacia financeira.
Anabela Serrão deteve-se na contextualização das três literacias avaliadas no PISA, comparando os resultados com os do PISA 2018. No PISA 2022, os rapazes tiveram melhores resultados a matemática e as raparigas na leitura, sendo esta uma tendência que se estende aos países da OCDE. Tal não se aplica ao nível das ciências, tanto em Portugal, como nos restantes países da OCDE. A organização alerta que desde 2012 se tem vindo a verificar uma quebra nos resultados, pelo que importa perceber, neste último ciclo do PISA, qual a parte que cabe à pandemia e a situações de perturbação que ela provocou.
Quanto às características dos alunos, a oradora frisou que os resultados por distribuição de ano de escolaridade ao nível da matemática mostram que a maioria estavam no 10º ano, ao contrário do que acontecia no ano 2000, em que essa distribuição era feita pelos 7º, 8º e 9º anos. Esta realidade mostra o efeito que a retenção tem no percurso dos alunos.
Professores elogiados na pandemia
Apontando a indicadores verificou-se que níveis de ansiedade superiores pioram resultados, sendo que ao nível do acolhimento na escola a maior parte dos alunos considerou positiva a sua experiência. Neste aspeto, Portugal apresenta um valor positivo, ao passo que a média da OCDE é negativa, o que mostra que os nossos alunos gostam de estar na escola. O interesse das famílias pelo dia a dia escolar é outros dos pontos em que Portugal tem resultado positivo, sendo que os alunos portugueses reportam uma avaliação muito positiva ao apoio dado pelos seus professores e pelas suas escolas durante a pandemia.
Anabela Serrão sublinhou ainda a percentagem de alunos top performers (bons alunos) e low performers (alunos menos bons) nos três domínios da matemática, leitura e ciências e deteve-se em seguida em questões relacionadas com o bem-estar dos alunos. O índice obtido em Portugal no índice de sentido de pertença à escola foi de 0.08, um dos mais elevados dos países participantes. Os alunos nacionais também elogiaram o apoio dado pelas suas famílias.
A fechar a sua intervenção, Anabela Serrão salientou que no ensino a distância durante a pandemia não existia um perfil que se pudesse estabelecer entre os resultados das escolas que abriram e das escolas que fecharam. No entanto, a nível nacional os alunos que reportaram níveis elevados de aulas online obtiveram melhores resultados. Na verdade, 72% assistiram – todos ou quase todos os dias – a aulas online de suas escolas.
De evidenciar, que os alunos portugueses demonstraram uma elevada confiança na aprendizagem autónoma, no caso da sua escola vier a fechar de novo no futuro.
Esta excelente intervenção de Anabela Serrão recebeu depois comentários individuais de três dirigentes da FNE: Gabriel Constantino (Presidente da Mesa do Congresso e do Conselho Geral), Josefa Lopes (Vice-Secretária-Geral) e Joaquim Santos (Secretário Executivo), que apresentaram uma visão mais sindical dos resultados do PISA 2022. Os comentadores concluíram por uma necessidade de maior investimento na educação, quer em recursos humanos – educadores, professores e pessoal de apoio educativo -, quer em recursos pedagógicos, quer em recursos nas estruturas físicas das próprias escolas.
Saldo migratório piora qualificações
Fechada a primeira intervenção, José Manuel Cordeiro (Vice-Secretário-Geral da FNE) apresentou Domingos Lopes, segundo orador convidado da conferência, que abordou "As competências e os conhecimentos de que precisamos para o futuro". Partindo das competências 2023 do Fórum Económico e Mundial, o Presidente do IEFP discorreu sobre os objetivos principais do Ano Internacional das Competências, que decorreu em 2023 e encerra em abril do corrente ano.
Domingos Lopes falou sobre como adequar as aspirações e as competências das pessoas às oportunidades no mercado de trabalho, especialmente no que diz respeito às transições ecológica e digital e à recuperação económica. E considerou que o que marca os tempos atuais é a mudança e a velocidade da evolução dos conhecimentos. Daí ter chamado à atenção para o facto das hard skills ficarem obsoletas num período de cinco anos.
Sobre o digital acentuou que a pandemia trouxe uma aceleração brutal, que tem vindo a ser tornada mais visível através da Inteligência Artificial, com o ChatGPT a assumir essa visibilidade, o que “obriga à adaptação das nossas competências no mercado de trabalho".
Domingos Lopes
Um outro objetivo passa por promover um investimento acrescido, mais eficaz e inclusivo na formação e na melhoria de competências, a fim de aproveitar todo o potencial da mão de obra europeia e apoiar as pessoas na transição de um emprego para outro. Este esforço passa por uma constante formação contínua, podendo levar a que quem não se atualize acabe por poder ficar fora da impulsão dada pela mudança.
Este propósito relaciona-se com o assegurar que as competências são pertinentes para as necessidades do mercado de trabalho, cooperando também com os parceiros sociais e as empresas. A isto acrescenta-se a necessidade premente de verificar que investimentos mais eficazes são necessários para as melhorias das qualificações e competências, conducentes a uma formação direcionada e ajustada a determinados setores do mercado de trabalho.
Um último objetivo tem que ver com a importância de atrair pessoas de países terceiros com as competências de que a União Europeia necessita, nomeadamente reforçando as oportunidades de aprendizagem e a mobilidade e facilitando o reconhecimento das qualificações. Quanto a este tema, Domingos Lopes considerou que é uma realidade o aumento do número de desempregados inscritos no IEFP, sendo que a maioria são estrangeiros, estando o país a recrutar lá fora para suprir algumas necessidades.
Porém, o saldo migratório está a piorar as qualificações, porque "exportamos mais qualificações e importamos menos qualificações, o que significa que estamos a defraudar expetativas em quem apostou na sua qualificação”. Ou seja: “estamos a manter um modelo de desenvolvimento económico que não é o mais adequado, porque o tecido económico e empresarial não está a acompanhar o aumento das qualificações nem a enquadrar no mercado de trabalho esta que é a geração com mais qualificações de sempre”.
Estamos no fundo a “manter um modelo de baixas qualificações, que gera um desafio que nos deve envolver e motivar a todos".
A prestação do Presidente do IEFP foi de seguida comentada por José Manuel Cordeiro, Maria Luísa Pires (Secretária Nacional da FNE) e Álvaro Santos (Vogal da Direção da AFIET), que deixaram algumas questões e observações sobre as competências atuais para o mercado de trabalho e a forma como aquilo que a escola produz não é acompanhado pelo desenvolvimento económico que não retém o talento.
Portugal em 20º nos ODS
Coube a Margarida Mano a terceira e última intervenção desta Conferência, subordinada ao tema “As competências e os conhecimentos de que precisamos para o futuro”. A ex-Ministra da Educação e Ciência no XX Governo Constitucional começou por citar o verso “sê todo em cada coisa”, de Ricardo Reis, “De nenhum fruto comas só metade”, de Miguel Torga, e “Já me sinto cansada dos passos que não dei”, de Natália Correia, para demonstrar que necessitamos dar de nós o máximo, seja em que atividade for. Em todas elas é preciso colaboração.
Nesta sua primeira ideia, "é preciso visão, ter uma ideia e saber para onde ir. O que é para mim educar não mudou muito nos últimos anos. Educar é preparar as gerações para o futuro, transformar. Transformar quem? As pessoas. Transformar o quê? A sociedade”. A Educação transforma as pessoas e deve contribuir para uma sociedade mais humanista, mais assente no Conhecimento, mais global. A sociedade tem que criar valor”.
A segunda ideia relaciona-se com o contexto em que vivemos. Para o explicar, Margarida Mano socorreu-se, entre outros, de documentos da OCDE e da OCDE, começando por citar as dez grandes tendências para a indústria em 2024, marcadas - por ordem decrescente - por uma Inteligência Artificial em ascensão, uma automação e robótica avançadas, pela realidade aumentada e realidade virtual, pela Big Data e pela conetividade em dispositivos.
Margarida Mano
Temos assim que trazer para fora do indivíduo algo de novo que vai beneficiar o coletivo. Já sobre o sistema educativo, é preciso "basear-se em premissas de maior valor para uma sociedade melhor no Futuro: flexibilidade, autonomia da Escola, cooperação e colaboração. E à escola exige-se que seja corajosa, plural e social”.
A terceira ideia que Margarida Mano trouxe à conferência foi a relevância da questão dos ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, incluindo como é óbvio o Objetivo 4 da Educação, que visa garantir o acesso à educação inclusiva e promover oportunidades de aprendizagem para todos ao longo da vida. A oradora recordou dados que colocam Portugal no 20º lugar na tabela dos países que mais aplicam os 17 ODS.
Transformar na educação
Temas fulcrais no nosso país são o envelhecimento dos professores, poucos jovens a entrar na profissão, as competências de que precisam os portugueses e o excesso de centralismo nos processos de decisão e governança. Utilizando dados do relatório “Education and Training Monitor 2023”, da Comissão Europeia, a Vice-Reitora da Universidade Católica demonstrou algumas carências do nosso sistema educativo, elegendo depois a multiculturalidade como um grande desafio nacional. A falta de incentivos e a falta de apoio dos empregadores para a formação é outro dilema que continua por resolver..
Usando desta feita o documento da OCDE “Trends Shaping Education 2022”, Margarida Mano interrogou-se sobre as questões fundamentais do tempo e do espaço na educação do futuro. Ou seja: quem educa e em que circunstâncias. “Quem educa deve ser um professor. Mas a quem deve responder e como?"
Há vários cenários já traçados sobre possíveis futuros para as escolas, para os professores e ensino e para a governação da educação e que passam pela escolaridade alargada, pela educação externalizada, pela escola como centro de aprendizagem e aprender em ação num contexto que cria tensões e paradoxos ao nível da modernização vs desorganização; novos objetivos vs velhas estruturas; inovação vs evitar o risco ou aprendizagem vs educação. São várias as questões que ficam em aberto para o futuro responder. Alguns destes cenários foram delineados pela OCDE no documento “Back To The Future of Education”.
Pedro Barreiros, Secretário-Geral (SG) da FNE, encerrou a conferência enaltecendo o papel que os trabalhadores da educação têm para um ensino de qualidade. O SG da FNE alertou para os resultados do PISA 2022 "que mostram que algo não está a funcionar bem no nosso sistema educativo. Precisamos de uma mudança na educação para um futuro que será marcado pela mudança e pela tecnologia. Uma educação que seja mais inclusiva e que dê verdadeiramente uma oportunidade a todos".
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